OS TEMPOS SELVAGENS DA JUVENTUDE - Parte 1
Renzo começou a dar aulas de Jiu-Jitsu quando tinha apenas 12 anos: ele ensinava tudo o aprendia com seu mestre Rolls Gracie aos seus amigos, na casa onde morava com sua mãe e seus irmãos na Barra da Tijuca. A imensa sala do segundo piso de sua residência era coberta por tatames e era frequentada por dezenas de garotos.
RENZO: O que o Jiu-Jitsu me dá, eu dou aos outros.
ENTREVISTADOR: E o quê o Jiu-Jitsu lhe dava nesta época?
RENZO: Poder. Coragem. E liberdade.
Ele tinha feito muitos amigos na escola pública que frequentava, na praia, nos prédios e casas das redondezas. Eram meninos pobres e ricos, negros e brancos, oriundos de caríssimas escolas particulares ou de precárias escolas do governo, de edifícios à beira-mar ou de barracos nas favelas.
VERA (mãe de Renzo): Desde criança ele aprendeu a tratar todas as pessoas da mesma forma e isso continua até hoje: dá a mesma atenção a cada um que encontra, seja um mendigo ou um rei. Ele sabe que as pessoas são, essencialmente, iguais.
Da parte de Renzo, não havia nada que impedisse aqueles garotos de estarem ali: só era preciso amar o Jiu-Jitsu como ele amava. Alguns acabavam ficando em sua casa por dias, meses e, às vezes, anos.
VERA: Renzo me disse que um amigo, o Félix, tinha sido expulso da oficina de pranchas onde dormia e precisava passar o fim-de-semana lá em casa. Eu concordei: o garoto ficou 15 anos. (Risos) Outro, o Klebil, morou 8 anos com a gente... Chegamos a ter 20 meninos dormindo lá. Eram tantas crianças que as pessoas tinham certeza que nossa casa era uma creche!
Com seu pequeno exército de lutadores formado (“dividindo o pão”, como costuma dizer), Renzo expulsou os traficantes de drogas de um amplo trecho da praia.
RENZO: Nós avisávamos pros caras: aqui vocês não vão vender drogas. Alguns aprendiam rápido, outros precisavam ser castigados pra entender... Uma vez quebrei a perna de um traficante. Disse a ele: “Estou fazendo isso pro seu bem, estou te dando uma chance de mudar. Porque talvez, a partir desta perna quebrada, você repense a sua vida e escolha um outro caminho. Um policial não vai te dar essa chance.”
Em pouco tempo, o tráfico de drogas tinha cessado no Quebra Mar.
RENZO: Nada disso foi planejado, as coisas simplesmente foram acontecendo. Nós reagíamos ao que sentíamos que estava errado. Muita gente questiona a existência de Deus. Uns dizem que Deus não existe, outros dizem que Deus é isso ou aquilo... Mas o fato é que a gente nasce com uma coisa única: a certeza no coração do que é certo e do que é errado. ISSO é o que eu chamo de Deus. Então você escolhe na sua vida qual caminho você quer seguir, que escolhas você quer fazer, diante dos problemas que vão aparecendo dia a dia. Porque você ganhou essa noção de bem e mal; todo ser humano recebeu esse presente.
Em uma de suas palestras, o psicólogo canadense Jordan Peterson afirma que: “...todos os jovens quebram regras, ou melhor: todos os jovens saudáveis o fazem.” Ao longo de sua adolescência, várias vezes o senso de justiça e o destemor de Renzo esbarraram em situações que o fizeram romper com determinadas regras de convívio social. Algumas destas situações o colocaram, mesmo, em uma posição de fora-da-lei... Mas nenhum destes incidentes, por mais violentos (ou “intensos”, como ele prefere chamar), o fizeram romper com a prerrogativa central ditada a ele por sua mãe quando era ainda muito jovem, e que jamais foi esquecida: “As únicas coisas que você não pode realmente fazer em sua vida são roubar e humilhar. A pior coisa do mundo, meu filho, é humilhar alguém.”
ROBSON (pai de Renzo): Nossa família sempre foi do enfrentamento, da luta – e da briga de rua também, se for preciso. A porrada ajuda a cristalizar a ordem.
Em uma entrevista, seu primo Relson destaca que o ambiente no Rio de Janeiro dos anos 80 era muito diferente da noção de civilidade que existe em países desenvolvidos. O que havia era um cenário de faroeste, no qual as brigas de rua eram inevitáveis: “Nós não procurávamos confusão, mas a confusão procurava a gente...” Em dado momento, confrontado pelo entrevistador, Relson afirma: “Se proteger a minha vida e as vidas das pessoas que eu amava era um crime, então eu fui um criminoso.”
(continua)
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